Para quem conhece o ritmo agitado de São Paulo, sabe que a cidade possui seu próprio tic-tac acelarado, a agenda é sempre apertada e mesmo sem ter tempo para ir naquele jantar dos amigos da época da faculdade, sempre existe um espaço para a contemplação. Normalmente, esse momento de apreciação acontece de forma espontanêa, seja entre uma mensagem e outra, de um compromisso para o próximo, ou quando olha para fora da janela do banco de trás do carro. De qualquer maneira, você se pega elogiando um monumento foi construido há anos e não mudou absolutamente nada, mas ele consegue te fazer admirá-lo como se fosse a primeira vez que estivesse vendo.
Já fazia algum tempo que eu não tinha aquele frio na barriga, a vontade de conversar com alguém até altas horas da madrugada e aquele sorriso que aparece no rosto sem nem mesmo ter notado. Entre tantas histórias mal-sucedidas e experiências que já não combinavam mais com as minhas escolhas, comecei a me questionar se realmente ainda existia algo ali dentro do peito.
As coisas foram ficando mais duras, as noites mais frias, e parecia que de repente tinha virado o shot da sobriedade, e dali para frente tudo seria de forma programada e ajustada. Até porque, quanto mais regrada a vida fica, menor a possibilidade do inesperado acontecer. Mas se engana quem acha que controlar a vida é ter tudo em ordem, pois é quando se menos espera que uma ventania chega e derruba todos os pilares que antes acreditava serem sólidos e macizos.
Fui levando os dias desta forma, permitindo me libertar de padrões que me seguiam e de pessoas que já não combinavam com o que eu acreditava. Desacelerando o passo e abrindo espaço para que algo que mesmo sem conhecer, tinha certeza que era o melhor do que o antes. Devagar e mais devagar fui deixando a vida me levar para algum lugar diferente daquele que eu estava, e a cada dia fui esvaziando e ficando mais leve. Limitações foram desaparecendo e de repente tudo aquilo que me incomodava nem estava mais presente.
Até que um dia, ao acordar, recebi uma mensagem de um número que eu não tinha salvo. Era ele.
Tinha se passado alguns anos desde a última vez que tinhamos nos visto. Naquela época ainda usava sombra de olho cor azul anil, e aguentava tomar tequila e trabalhar no outro dia. Foram apenas trê palavras para fazer com que tudo borbulhasse de forma intensa. Como se aquilo que foi apagado ao longo de meses tivesse sido incendiado em instantes. E nesta oportunidade de poder reviver o que antes já senti, sabia que na primeira oportunidade iriamos nos ver.
Daquele dia em diante, não paramos mais de conversar, foi quase como se tivessemos reconectado dois cabos de energia e tudo era faísca. Do outro lado da linha eu só conseguia pensar como seria quando eu o encontrasse. Será que existe roupa certa para esse tipo de date? Será que vai ser como está sendo a distância? Qual é o melhor sapato para calçar quando não se lembra da altura da outra pessoa?
Perguntas e mais perguntas foram tomando meus pensamento e tornando os meus dias mais preenchidos. A espera, os sentimentos e o vazio de antes começaram a fazer sentido, mas mesmo se nada fizesse sentido, pelo menos, estava curtindo estar presente no meu dia-a-dia.
Mais dias se passaram até que enfim conseguimos marcar um encontro. Estava ansiosa e não via a hora de encontrá-lo. Ao entrar no carro, só conseguia criar diversos cenários e múltiplos diálogos que poderíamos vir a ter. Minha mente estava incontrolável — o que me fez optar por ouvir música para tentar relaxar.
Fui a primeira a chegar, estava no lobby do hotel do qual iríamos jantar. O espaço tinha luz baixa e uma música de Jazz tocando ao fundo. Pedi um cosmopolitan e a cada gole que eu dava fica mais sóbria para lidar com a angústia. De minuto em minuto, desbloqueava o celular para ver se tinha alguma mensagem, encontrando sempre o que tinha visto no segundo anterior. Ao perceber o espelho na minha frente, tentei arrumar a franja que estava bagunçada de tanto que colocava a mão na cabeça, e foi naquele instante que pelo reflexo vi alguém passando pela porta. Ele tinha chegado.
Continua.
A.M.

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