Buuu!

Assumir que não existe jeito certo de dizer que não está afim de alguém talvez seja o primeiro passo. De todas as formas alguém vai acabar com suas próprias expectativas amassadas e jogadas no lixo. Ser o responsável por colocar o ponto final em uma história criada pelo outro é tão difícil que às vezes a melhor forma de não fazer isso é… sumir.

Antes mesmo do termo ghosting ter se tornando popular, já se praticava a arte de “sair para comprar um cigarro”, Capitu já tinha sido mandada para a Suíça e alguém já esperou por dias a ligação que nunca aconteceu. Atualmente, com tantos dispositivos conectados a todo momento, mostrando quem está ou não online em diferentes plataformas, evitar a indelicadeza do pé na bunda é um grande desafio.

Para quem conhece as ruas da Vila Madalena, sabe que em dias de verão tudo fica alagado em poucos minutos. Dificultando qualquer pessoa que mora do outro lado da cidade a manter o bom humor. Tudo pode parecer conspirar contra você até tudo fazer sentido. Afinal, a chuva que incomoda pode se tornar trampolim para horas de conversa e cerveja barata, elevando depois a noite para uma garrafa de vinho caro com vista privilegiada, tornando a luz amarelada e o cheiro de tabaco o cenário perfeito para o nascimento da nova Simone de Beauvoir. Só que nesta história, o segundo sexo é apenas o livro publicado.

Foram dias enlouquecendo com conversas que pontualmente terminavam no mesmo horário. Arrastava as noites com a esperança de que na manhã seguinte acordaria com alguma mensagem — o que sempre tornava a ser meu martírio. Então, tomava uma dose de ilusão acreditando que era só uma fase ruim. Até que um dia, aquele dos mais ocupados que nos deixa distraídos, notei que depois da minha pergunta não houve mais resposta.

Seja como for, a parte mais complicada de lidar com o silêncio após uma súbita experiência excitante é o abismo que ele abre para a ansiedade entrar. Deixando rastros de delírios como: “será que fiz algo de errado?” ou “deixei de fazer algo?”. É fazer com que o outro recapitule os momentos vividos repetidamente na tentativa de achar um sinal que talvez tenha passado despercebido. É escrever uma história em que no último parágrafo escolhe não colocar nem ponto e nem vírgula, levando o leitor a confusão.

Será que entre a dúvida e a certeza, permitir um breve espaço para sonhar seja a melhor forma de terminar? Ou, saber de uma vez que o que aconteceu foi só aquilo é a melhor saída? Acredito que não existe fórmula para saber lidar com o desinteresse do outro. Mas entre desaparecer e mandar o recado, hoje escolho enfrentar os fantasmas.

A.M.

Leave a comment

Comments (

0

)