Caracolândia

Alguns dizem que a maturidade vem depois de uma grande queda. Surge quando o mundo cor-de-rosa começa a adquirir aspectos da realidade, como a de uma cidade fria e rodeada de concreto. Talvez o tempo ensine que amadurecer é se prevenir com uma máscara de cílios da Shiseido; trocar a jaqueta jeans por um blazer; ou, quem sabe, apenas admitir que uma boa garrafa de vinho em sua própria companhia é mais divertida do que uma noite de cervejada.

Sinais de crescimento também podem ser muito mais complexos do que isso. Afinal, eles se revelam nas escolhas do dia a dia, aquelas que nos convidam a educar a criança que há dentro de nós.

Há quem se delicie com a imensa aventura que é envelhecer. É possuir a sabedoria e a tranquilidade de entender que tudo tem seu tempo e que, se você perde tempo demais, no fim não tem nada. É caminhar tranquilo ao lado das suas frustrações e dizer a você mesmo que não precisa ser incrível em tudo o que faz, mas ter a humildade de melhorar o que é possível.

Já outros odeiam a ideia de crescer. Mentem a idade, escondem as rugas e batem na tecla de que a idade é só um número. Vivem uma vida sem cobranças nem regras. Todo dia pode ser uma aventura. Sentir que é jovem, pelo menos, é sentir alguma coisa. E, ao longo dessa curta jornada, a melhor coisa que se pode ter é a certeza de que fez tudo o que um dia sonhou.

Não importa sua essência. A vida cobra seu preço. Um dia você está caminhando distraído, no outro se vê diante das responsabilidades. É um processo sutil, as coisas vão acontecendo até que fica claro que a fase de atuar como criança acabou. Porque se você não mudar, a vida simplesmente passa por cima. Foi assim que, em uma casa de Jam em Pinheiros, acabei atravessando a rua da maturidade.

Era semana de moda em São Paulo e tudo estava confirmado para que todos os lugares estivessem lotados. Mas, para aqueles que têm coragem de cruzar o Largo Santa Cecília, passar pelo vale das barracas nas calçadas e desviar das adversidades do viaduto, ao final do arco-íris terá um aglomerado de pessoas impacientes estendidas. Seja bem-vindo a Caracolândia.

A fila de 30 minutos pode ser intimidadora para quem é iniciante, mas aqueles que conhecem a hostess e possuem a senha do Wi‑Fi, uma hora do lado de fora, não é nada. Depois de dois ou três drinks em um dos bares mais descolados e disputados de São Paulo, sempre há o after mais duvidoso do mundo. O segredo é que se ninguém te convidar, não tem como achar. Mas, caso você se torne conhecido por lá, fale com a pessoa certa e o desconto na entrada virá.

Nessa casa com quatro ambientes diferentes, encontram-se desde estudantes até simpatizantes. Não tem muito sentido explicar o que se toca lá, mas talvez esse seja o charme. Cerveja barata e a lanchonete do lado de fora. No quarto onde as pessoas tocam, fique de olho no piano. Ele é o único lugar para se sentar. Porém, foi perto do balcão do bar que vi que alguém não estava prestando atenção à banda tocando.

Ele era só um músico de meia-idade. Sua conversa despreocupada e seu grande repertório fizeram com que eu questionasse meu interesse. Talvez seja a vivência ou os traços da personalidade, mas, em poucas horas, a conversa despreocupada deu lugar a um monólogo. Com meia dúzia de perguntas, o homem tranquilo se transformou naquela figura conhecida: o palestrina. De repente, o que era para ser um date se torna uma discussão sobre as gerações. Afinal, o que uma pessoa de vinte e poucos anos sabe sobre a vida?

Independentemente do que seja maturidade. Naquela noite entendi o real significado para mim. Ser maduro está longe de ser alguém que abdica de sua felicidade para parecer mais sábio. É viver a sua verdade independentemente do que os outros vão achar. E que, se ainda me chamarem de imatura, eu escolho morrer de rir ao ajudar meu amigo a colocar suas roupas após ser a última pessoa a sair da festa.

A.M.

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